Presidente do TJMG ressalta importância da conciliação

Desembargador Gilson Lemes afirma que acordo entre a Vale e o Estado teve momentos de tensão superados pelo diálogo

“O acordo foi fechado em um tempo razoável dando à sociedade uma resposta rápida. Com isso, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais cumpre o seu papel de fazer Justiça. Mas, devemos ressaltar sempre: isso não é motivo de comemoração. O rompimento da barragem provocou a morte de 259 pessoas e há, ainda, 11 desaparecidos. Somos solidários a todos os atingidos. O que ressaltamos aqui é a pronta resposta do Poder Judiciário”.

Confira a entrevista com o presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, desembargador Gilson Soares Lemes, sobre o acordo entre Vale S.A., o governo de Minas e instituições públicas, envolvendo o rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho.

Este foi um acordo histórico para Minas Gerais e para o Brasil, e com valor bastante significativo. O que essa mediação do TJMG representa para o Poder Judiciário?

Esse acordo da Vale com o Estado e as instituições jurídicas representa um grande avanço do Poder Judiciário mineiro e brasileiro. Conseguimos resolver, com a mediação e a conciliação, um grande conflito. Trata-se de um modelo que nós já implantamos em quase todas as comarcas, que são os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs). As partes podem trazer os conflitos a essas unidades, para que haja uma mediação do Poder Judiciário e, assim, uma solução. A decisão será efetivamente cumprida pelas partes, já que a construção do consenso é aberto. Isso ocorreu no processo da Vale, cuja mediação e conciliação é hoje um paradigma para outros conflitos e outros processos complexos, que podem ser resolvidos da mesma maneira.

Quais são os próximos passos nesse acordo? 

O processo agora retorna para a Primeira Instância, para a 2ª Vara de Fazenda Pública Estadual de Belo Horizonte, onde terá sequência. É o juízo da 2ª Vara que irá cumprir a execução desse acordo. Todas as parcelas a serem pagas serão depositadas junto a esse juízo, e o juiz Paulo Tamburini, titular dessa vara, fará o levantamento de tudo para que os repasses sejam feitos aos atingidos ou ao governo, conforme estão previstas as destinações das parcelas.

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“Em dois anos, o processo tramitou e chegou ao final com uma indenização razoável”, destacou o presidente Gilson Soares Lemes

Qual o significado desse acordo para o Poder Judiciário?  

Com a homologação desse acordo histórico para o Poder Judiciário, estamos vendo, sim, uma nova modelagem da Justiça. Trata-se da busca pela resolução dos conflitos de maneira mais econômica, mais rápida, mais sensata e com a participação das partes. O nosso Código de Processo Civil, logo em seus primeiros artigos, determina que o Estado deverá promover, sempre, a mediação e a conciliação. Essa é a forma com que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais tem agido. Nossos Cejuscs já estão instalados em quase todas as comarcas de Minas Gerais. Temos também o Cejusc Virtual, onde é possível as partes tentarem a conciliação de maneira remota.

Como foram os bastidores dessas negociações que acabaram culminando com a formulação desse acordo? 

É importante ressaltarmos que, para esse acordo, não foram feitas apenas as cinco ou seis grandes audiências que realizamos no TJMG, com todos os envolvidos. Além delas, foram realizadas, no Cejusc 2º Grau, mais de 200 horas de reuniões internas, em dias de semana, finais de semana e durante o recesso do Judiciário. Nessas reuniões internas, foram entabuladas todas as cláusulas do acordo. São mais de 100 laudas que estabelecem a forma de fazer, quem vai fazer, quem vai pagar, o prazo de construção, quando serão feitos os depósitos, as obras que serão realizadas. Tudo está estabelecido no acordo, de forma minuciosa. Isso só foi possível porque houve um clima favorável a esse consenso. Dentro do TJMG e do Cejusc 2º Grau, foi criado um clima de confiança entre as partes e, também, de confiança no Judiciário mineiro. Assim, nós construímos esse acordo histórico que, com certeza, dará uma resposta mais rápida aos atingidos e permitirá ao Estado a construção de dezenas de obras. Nós não sabemos em quanto tempo ele poderia ser finalizado, se não fosse a conciliação. Com uma série de recursos a sentença seria dada talvez daqui a dez ou quinze anos.

Houve algum momento de tensão durante essas negociações?

Durante as reuniões, sempre existem alguns momentos de tensão. A mediação é assim mesmo: existem momentos de mais consenso e outros de discordância. Por isso, sim, houve momentos de estresse. Na audiência de janeiro, por exemplo, houve um momento de tensão das partes autoras. Mas nós ponderamos que era necessária uma reflexão melhor de todos; adiamos as negociações por sete dias, depois por mais 15 dias. Nesse período, houve uma reflexão muito grande de todos. E então, na primeira semana de fevereiro, chegamos ao acordo final. São normais esses momentos de tensão, dentro da mediação; mas o mediador tem que ter paciência, pois não se faz um acordo desse porte em uma ou duas audiências. Tivemos paciência para que chegássemos a um bom termo.

Quais benefícios este montante de 37 bilhões pode trazer? 

Serão muitos os benefícios sociais, econômicos e ambientais. Tudo isso está englobado no acordo. Só não estão englobadas nele as ações individuais – as pessoas podem continuar demandando, e muitas já fizeram acordo – e também as ações criminais. Desses R$ 37,7 bilhões, por exemplo, quase R$ 10 bilhões serão destinados aos atingidos, para transferência de renda, durante quatro anos, e para a construção de diversas obras nas regiões atingidas. Essas obras serão eleitas pela própria comunidade. A associação dos atingidos é que irá definir todas elas. Além disso, haverá uma recuperação ambiental, pela companhia Vale. Também o Governo do Estado irá investir em obras em todo o Estado. São dezenas de obras que, com certeza, vão acelerar a economia, gerando mais empregos, e isso é muito importante para Minas Gerais. O acordo tem benefícios em várias áreas, e é muito bom para a sociedade.

A conciliação e a mediação permitem o protagonismo das partes na construção da solução de conflitos. Nesse sentido, os acordos podem trazer mais pacificação que as sentenças? 

Com relação à comparação entre o acordo e a sentença, é importante esclarecermos que, quando as partes aguardam uma sentença, ela pode demorar dois, três ou quatro anos. Ou mais tempo. Mas, como todos sabem, existem inúmeros recursos que podem ser interpostos e, com isso, essa demanda poderia tramitar durante 15 ou 20 anos. Além disso, a decisão do juiz, ou a decisão que o Tribunal de Justiça proferisse, ao final, poderia não agradar tanto às partes, como elas esperavam. Não sabemos como a empresa estaria daqui a tantos anos, ou seja, se ela teria dinheiro para poder honrar esses compromissos. No caso do acordo entre a Vale e o Governo de Minas, o montante de R$ 55 bilhões era apenas um valor estimado, pois não havia perícias que o comprovassem. Já o valor acordado, de quase R$ 38 bilhões, é um valor razoável para a indenização, e as próprias partes entenderam isso. Além disso, ele dá uma resposta mais rápida à sociedade. Foram as próprias partes que estabeleceram os valores e as obras onde os recursos serão empregados, algo que, na sentença, não poderia ser feito. A sentença apenas destinaria o dinheiro ao Estado ou aos atingidos. Essa foi uma solução mais pacífica, mais rápida e mais econômica, e que, com certeza, dá mais efetividade ao cumprimento das obrigações.

Há outras grandes demandas tramitando no Judiciário mineiro. O senhor já vislumbra novos acordos, em áreas distintas? Poderia nos antecipar algo nesse sentido? 

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais tem outras demandas importantes, complexas e de valores altos, que poderão ter o mesmo fim, ou seja, poderão vir para o Cejusc 2º Grau, para uma solução mais rápida e consensual. Podemos citar, por exemplo, um programa que estamos lançando neste mês de fevereiro: o Destrava Minas, com participação da Advocacia-Geral do Estado, do Ministério Público e do TJMG. É um programa no qual o Judiciário, o Ministério Público, o Cejusc e o Estado vão identificar obras que estão paralisadas em função de liminares que foram concedidas, e até hoje não se resolveu o mérito da demanda. Então, é uma forma de fazer um acordo, destravar esses processos e dar sequência a essas obras, o que é muito importante para a economia de Minas. Podemos lembrar também, com relação a demandas, o acordo que foi feito, aqui no TJMG, entre o Governo do Estado e todos os municípios de Minas Gerais, em relação ao repasse do Fundo de Educação, que o Estado devia aos municípios. Fizemos esse acordo no Cejusc 2º Grau, e hoje o Estado paga parcelado a cada um dos municípios, solucionando a deficiência que os municípios tinham de receber esses valores.

 

Assessoria de Comunicação Institucional – Ascom

Postado originalmente por: Portal Sete

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