Entrevista: para promotora, aplicativo dos combustíveis gera concorrência

 

O valor do preço dos combustíveis em Uberaba gera uma série de reclamações entre os motoristas. Os órgãos que atuam na defesa do consumidor são constantemente acionados para encontrar solução que possa gerar competitividade no setor. Recentemente, o Ministério Público recomendou à Câmara Municipal de Uberaba (CMU) agilidade na elaboração de projeto para criação de aplicativo de monitoramento dos preços dos combustíveis em tempo real. Esta possibilidade surgiu com a tramitação de um projeto, de iniciativa do Poder Executivo, que regulamenta o funcionamento dos postos revendedores de combustíveis no município. A matéria até constou na pauta de votações em reunião ordinária do Legislativo, mas foi retirada a pedido do vereador Samuel Pereira (PL). O parlamentar já informou que devolveu a proposição ao Legislativo e o projeto, em tese, já tem condições de retornar ao plenário. Sobre a inclusão do aplicativo na proposição, ainda há algumas dúvidas jurídicas sobre a questão.

O modelo de aplicativo foi buscado pela promotora de Defesa do Consumidor, Monique Mosca Gonçalves, no Estado de Goiás. Lá, o aplicativo foi desenvolvido pela Universidade Federal de Goiás (UFG), no ano passado, graças a uma lei estadual aprovada e sancionada em novembro do ano passado. A ferramenta já passou pela fase inicial de testes e adequações. Durante o período de testes, cerca de 480 postos do Estado fizeram o cadastro e não precisarão fazer outra inscrição. Em julho passado, o aplicativo “Olho na Bomba” foi desativado por conta de medida cautelar que suspendeu a eficácia da Lei 19.888/17. Mais de 410 mil consumidores já baixaram o aplicativo. A estimativa, segundo o jornal Diário de Goiás, é que o aplicativo tinha média diária de 17 mil acessos.

A promotora Monique Mosca Gonçalves fala a respeito da possibilidade de criação do aplicativo em Uberaba e das medidas que o Ministério Público adota em relação ao comportamento dos preços dos combustíveis na cidade.

Na semana passada, o Procon Uberaba solicitou ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) abertura de procedimento para investigar o mercado de combustíveis na cidade. No pedido, o Procon apresentou, em detalhes, a situação atual verificada na cidade através de pesquisas de preços realizadas durante todo o ano de 2018 e meados de 2019. Em resposta à solicitação do Procon, o Cade afirmou que a prática de preço paralelos no mercado de consumo de combustíveis não é suficiente para a abertura do processo administrativo, sequer para promover investigações acerca de possíveis crimes contra a ordem econômica.

A promotora também atua na Curadoria do Meio Ambiente. E, recentemente, fechou Termo de Ajustamento de Conduta com a Companhia Operacional de Desenvolvimento, Saneamento e Ações Urbanas (Codau) para construção de um mirante na Univerdecidade.

Jornal da Manhã – A senhora fez uma recomendação à Câmara Municipal de Uberaba para agilizar a legislação que dará sustentação ao funcionamento de aplicativo que informará, em tempo real, o comportamento dos preços dos combustíveis nos postos revendedores do município. Como funcionaria esse aplicativo?
Monique Mosca Gonçalves –
Esse aplicativo deve trazer uma informação ao consumidor e incrementar a competitividade entre os fornecedores de combustíveis para que se possa ter melhora nos preços ofertados, em benefício do consumidor. É uma questão de informação e competitividade.

JM – Está em tramitação na Câmara um projeto que regulamenta o funcionamento dos postos revendedores de combustíveis no município. Qual seria a medida, então, para regulamentar o funcionamento desse aplicativo no município?
MMG –
O ideal é que seja elaborado um projeto pelo Poder Executivo, uma vez que envolve a Codiub (Companhia de Desenvolvimento de Informática de Uberaba), que já desenvolveu esse aplicativo. Sei que, em relação ao projeto, ainda se encontra no âmbito das deliberações entre a Câmara de Vereadores e a Prefeitura.

JM – De qualquer forma, para a criação desse aplicativo é necessária uma legislação específica, para exigir que os postos revendedores de combustíveis forneçam as informações sobre os preços em tempo real…
MMG –
Exatamente. Essa questão da legislação trata-se de um modelo que surgiu em Goiás. É preciso obrigar os postos de combustíveis a fornecer o preço em tempo real. Então, é necessário, sim, um instrumento legal para que se tenha essa obrigação.

JM – Hoje, a obrigação dos postos é referente à colocação de placas em locais visíveis, informando o preço dos combustíveis ao consumidor…
MMG –
A ideia do aplicativo é para fornecer, em tempo real, os preços de todos os postos do município. Isso possibilitará ao consumidor que ele se dirija ao estabelecimento com melhor preço, de acordo com a localização. Essa informação trará uma possibilidade a mais para o consumidor frente aos preços aplicáveis no município.

JM – Há anos o consumidor uberabense reclama de que poderia existir uma combinação de preços entre os postos de combustíveis na cidade. Ministério Público abriu algum procedimento para esse tipo de investigação?
MMG –
Existe uma investigação. Mas, ainda não é possível afirmar se ocorre ou não essa combinação. Isso precisa ser apurado através de via criminal. O que eu posso afirmar é que existe uma inconsistência de preços aqui em Uberaba. Por isto, para conferir maior transparência ao consumidor é que fui buscar o modelo de um aplicativo, desenvolvido no Estado de Goiás, para possibilitar maior competitividade no mercado. Não tem a ver com investigação alguma. O ponto chave do aplicativo é estimular a concorrência, para termos maior transparência nos preços aplicados aqui e, com isto, favorecer o consumidor.

JM – O que pode motivar o Ministério Público a abrir algum procedimento sobre o comportamento dos preços praticados em Uberaba?
MMG –
O que há hoje é que o Ministério Público é constantemente demandado pelo consumidor, que reclama de aumentos súbitos de preços. E hoje não temos uma ferramenta para apurar melhor essas questões e intervir. Vale lembrar que não existe tabelamento de preços, o que podemos fazer é buscar um instrumento que dê transparência ao consumidor.

JM – Parece-me que já existe um modelo desse aplicativo, ele já estaria pronto…
MMG –
Já foi desenvolvido pela Codiub, mas agora precisa de um instrumento legal para que seja aplicado. Tem que ser coercitivo, pois se depender da voluntariedade dos fornecedores, o aplicativo não será efetivo. Se o projeto for aprovado, o consumidor poderá, através desse aplicativo, fazer uma denúncia diretamente ao Ministério Público sempre que houver uma inconsistência entre o preço informado no aplicativo e o preço praticado no estabelecimento de forma específica.

JM – O aplicativo até poderia estar em operação, mas aí dependeria de ação voluntária dos postos; e talvez nem todos se disponham a fornecer os dados. E se apenas uma parte informar os preços, o aplicativo perde seu sentido. É isto?
MMG –
Sem a obrigatoriedade, a efetividade do aplicativo seria reduzida. Dependeríamos da adesão voluntária dos fornecedores e, com isso, perderia um pouco a efetividade. Existem outros modelos de informação. Por exemplo, há consumidores que trocam informações por meios de mensagens instantâneas. Mas a ideia do aplicativo é vincular. A partir do momento em que a informação é disponibilizada no aplicativo, aí teremos a efetividade.

JM – O Ministério Público já verificou a razão pela qual os preços dos combustíveis em Uberaba costumam ser mais altos do que os praticados em cidades vizinhas e, até mesmo, em postos localizados nas rodovias?
MMG –
Pelos instrumentos que temos à disposição, já foram feitas todas as investigações necessárias. Mas essa não é uma questão simples de se apurar, até pela livre concorrência. Por isto, fomos buscar esse aplicativo, para darmos transparência maior e, obviamente, buscar competitividade e oferecer melhor preço ao consumidor.

JM – Vamos falar de meio ambiente… A polêmica da vez está na implantação de um condomínio na Mata Eva Reis – Quinta da Boa Esperança. Há resistência de ambientalistas, mas haveria um projeto no qual o empreendedor se compromete a preservar a Mata. Como o Ministério Público acompanha essa situação?
MMG –
Esse caso é fruto de um acordo. O Ministério Público recebeu informações sobre esse projeto e daí demandamos a nossa coordenadoria, em Belo Horizonte, para fazer uma perícia a fim de apurar se o projeto atende a todas as determinações legais. Com base nessas informações, fizemos um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Mas a questão está sub judice, porque houve uma ação popular e, agora, essa questão será decidida na Justiça.

JM – A Codau e a Prefeitura anunciaram a construção de um mirante na Univerdecidade. Os recursos dessa obra são provenientes de TACs da ordem de R$800 mil. A Codau assinou esse TAC para compensar algumas ocorrências na área ambiental. Como funcionou?
MMG –
Esse TAC é fruto de alguns procedimentos que estavam em andamento no Ministério Público, referentes a danos ambientais, em face da Codau. Hoje seguimos o modelo de resolutividade e efetividade na atuação. Por isto, fizemos esse acordo. Conversamos com a direção da Codau e foi proposto esse projeto, que trará muitos benefícios à população carente de áreas verdes e espaços públicos para o lazer. E, com isso, conseguimos encerrar alguns procedimentos e transformar alguns prejuízos em benefícios para a população.

 

Postado originalmente por: JM Online – Uberaba

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