‘AMIRT entrevista’ recebe José Benedicto de Souza, da Rádio Estância, de Jacutinga

José Benedicto de Souza é radiodifusor e fundou em 1983 a Rádio Estância, de Jacutinga, no Sul de Minas Gerais. Em entrevista realizada pelo Portal AMIRT, Benedicto contou um pouco do papel que sua rádio desempenha no município e também relatou o que a emissora representa para ele.

Além disso, destacou que a Rádio Estância se notabiliza por promover campanhas em busca da conscientização das pessoas sobre a importância de preservar o meio ambiente.

Confira a entrevista: 

Quando foi seu primeiro contato com o rádio?

José Benedicto: Quando saí do seminário de Pouso Alegre, em 1950, desisti de ser padre, pois precisava continuar estudando e ter uma profissão. O magnetismo (eletricidade) e os elétrons (eletrônica) sempre me fascinaram. Comecei a fazer um curso de eletrônica e quando terminei fui ser auxiliar do técnico da Rádio Clube de Itapira-SP, quando fui “contaminado” pelo rádio. Posteriormente, com 17 anos, cumprindo com o meu dever, me alistei no exército e através de um concurso fui classificado para a Escola de Comunicações, no Rio, em 1959, e acabei seguindo carreira no exército.

Quando o senhor decidiu fundar uma emissora de rádio?

José Benedicto: Em 1980, mesmo estando no exército, abri um canal de rádio em Jacutinga, onde morava, que depois de muito trabalho entrou no ar em 16 de junho de 1983.

Na sua opinião, o que mais mudou na Rádio Estância desde a fundação?

José Benedicto: Muitas coisas mudaram, a principal foi a migração do AM/FM. Devo dizer que a ABERT e a AMIRT contribuíram muito para que isso acontecesse. Em um congresso da ABERT, em Brasília, sugerimos ao presidente que levasse um rádio AM no interior do Congresso Nacional para mostrar a dificuldade de sintonizar uma rádio AM, para assim convencer os deputados, pois alguns países já realizavam a migração. Explico: com a mudança climática, uso das lâmpadas eletrônicas, fontes chaveadas, construções com muitas ferragens, fiações, o AM ficou muito mais ruidoso, sem falar na qualidade de som. Não havia condições de permanecer no AM, nem o AM stereo, pdm ou outra modalidade. Gostei da mudança do AM para FM, mas tenho saudades.

O Rádio atual é multiplataforma, ou seja, também está em diversas mídias, como Facebook e Instagram. Como o senhor avalia o rádio hoje em dia?

José Benedicto: O rádio atual tem muitos concorrentes, mas sempre supera ou se adapta. O maior inimigo do rádio é o Ecad, que exige que os radiodifusores coloquem as músicas no padrão exigido por eles, e nós, radiodifusores, temos um trabalho muito difícil para colocar no padrão. Eles se acomodam e assim ficam aquelas músicas repetindo o mês todo. O rádio fica “chato” e se não há interesse em ouvir rádio, o aparelho rádio estraga e a pessoa acaba ficando sem rádio. Ela acomoda e se acostuma a não comprar outro, ficando só com a televisão, que é mais completa e dessa forma o rádio acaba não fazendo falta. Os rádios que estão nas lojas quase sempre são de baixa qualidade, precisamos resolver isto. Ainda existe a questão das músicas chatas e sem qualidade, com os artistas querendo fazer sucesso a todo custo. Sugiro aos radiodifusores que façam sempre sorteios de aparelhos de rádio e que as lojas, principalmente, façam textos bem convincentes e também promoções de aparelho de rádio.

A Rádio Estância realiza trabalhos de conscientização do meio ambiente. De quem foi a iniciativa?

José Benedicto: O trabalho de conscientização do meio ambiente desde 1983 foi meu.

Ao conversar com o senhor, percebemos o quanto esta pauta é importante para a emissora. Quais trabalhos a Rádio Estância já realizou para preservar o planeta?

José Benedicto: Inicialmente, foi com mensagens, programas, campanhas nas escolas, coletas de pilhas e baterias. Posteriormente, lâmpadas fluorescentes, óleo de frituras, aparelhos eletrônicos e tudo que contamina o solo e água. O ônus do descarte correto é da rádio. Atualmente, pilha e bateria são descartadas na TGA Tech, em Mogi Guaçu/SP, ao preço de R$ 3,50 o quilo. Antes era na Suzaquim, em Suzano/SP, que fica há mais de 400 km de Jacutinga, contabilizando ida e volta.

Desde 1983 já descartei muitas toneladas que deixaram de contaminar o solo e a água. Lâmpadas fluorescentes eu não recebo mais, pois o descarte é muito caro e ninguém ajuda. O último descarte, muito acumulado (uma carreta), me custou quase 20 mil reais. As instruções do Ibama não funcionam e não são práticas.

Percebo nesses longos anos que ninguém se preocupa com o planeta, ninguém respeita a natureza, parece que a ecologia não tem espaço nos governos, nas religiões e na população que está destruindo o planeta. É um consumismo e desperdício de tudo. As embalagens parecem que possuem mais valor que o produto e vão para o lixo comum. Os rios perenes deixarão de existir, as nascentes (minas) estão sendo assoreadas pela facilidade de movimentar muito a terra e rodam para os fundos de vales. Vai faltar água para abastecer muitas cidades. Ficará insuportável viver na Terra devido ao sol muito quente, às queimadas e ao comportamento humano.

Formamos uma fundação chamada de “Fundação Rádio Educacional de Proteção ao Meio Ambiente” para dar mais resultados práticos ao meio ambiente e nunca recebemos um único centavo. Quando procurei para ajudar no descarte de material poluente, nos informaram para seguir as instruções do Ibama, que consiste em devolver ao fabricante ou a loja onde comprou. Se a loja é de Jacutinga, ela manda para a Rádio Estância ou para o lixo comum. Só deu trabalho burocrático e pouco resultado.

Na última reunião, decidimos encerrar, só falta o curador do meio ambiente autorizar o encerramento. Nos meus 82 anos, vejo o quanto a ciência avançou e trabalham silenciosamente que até sinto que vamos encontrar Deus através da ciência. Depois que inventaram o transístor, o CI, as memórias e puderam aplicar a técnica digital com funções complexas e surgiu o computador, a memória inteligente e tudo isto que temos hoje, vem aí o 5G.

Mudando um pouco de assunto, o senhor possui uma coleção de rádios, com dezenas de exemplares. Qual aparelho considera mais importante e quando decidiu colecionar rádios?

José Benedicto: O mais importante é um rádio Stromberg Carlson, de 192. Muito bonito, móvel muito bem trabalhado e está conservado e funcionando, pois já era superheterodino. Tenho mais de 500 rádios antigos, aparelhos eletrônicos, principalmente do Exército,  Marinha e Aeronáutica, inclusive de telegrafia, teletipo (telex), vitrola de corda e outros equipamentos, pois também sou radiotelegrafista e rádio amador classe “A” com prefixo py4 cgy desde 1959, uma época em que a comunicação era difícil e o telefone era via telefonista. Fiz contato com vários países, principalmente em telegrafia, fonia, mesmo não sabendo falar o idioma daquele país, era feito pelo código “Q” conhecido mundialmente. Eu ficava de plantão no rádio para atender solicitação de medicamento, que era solicitado de lugares distantes e uma empresa de aviação chamada de Panair do Brasil e também a Varig levavam nas imediações.

Sempre tive o sítio em Eleutério, onde guardo tudo que é antigo, inclusive eu mesmo. A ideia era fazer um grande museu na estação da Estrada de Ferro Mogiana e rede mineira de viação, divisa de São Paulo e Minas Gerais, que está desativada há muito tempo e o prefeito de Jacutinga demorou para responder oficialmente a consulta que a RFSSA fez ao prefeito, se interessava e caso houvesse desistência eu seria o interessado que a RFFSA já sabia. Fiz até o cadastro na Caixa Econômica e nessa demora foi extinta e passou o patrimônio para a União que foi a leilão por um preço irrisório e o felizardo não deseja vender nem com muito lucro. Está lá abandonada. Isto aconteceu há uns 20 anos atrás. Um oficial de Brasília muito conceituado iria participar dessa empreitada, mas com muita influência desistimos.

Eu com a minha idade não quero deixar esta trabalheira para os meus filhos. Vejo, atualmente, que a geração não interessa por coisas velhas, como chamam. Devo informar que temos mais de 8 mil discos 78, 45, 33 e CD’s.

Um abração a você e a equipe da nossa querida AMIRT.

Rádio Estância, em Jacutinga

Foto: José Benedicto de Souza/Acervo Pessoal

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