A ausência de manifestação popular

As reiteradas ameaças de Bolsonaro e filhos ao STF e ao Congresso Nacional são feitas e prosperam no vazio da participação popular que existe na vida política e social no Brasil, hoje ainda mais aprofundado. As intimidações não são dirigidas particularmente a ministros, deputados e senadores, que lá estão de passagem. Atingem as próprias instituições, que são constitucionalmente intocáveis.

Na República, todo poder emana do povo. Logo, suas instituições nada mais são do que representações da vontade popular. São os cidadãos que as legitimam, garantem e fiscalizam o seu funcionamento imparcial a serviço do bem-estar comum. Elas não se justificam apenas por si mesmas.

Quando o deputado Eduardo Bolsonaro diz que basta um cabo e um soldado para fechar o STF, o faz livre e impunemente porque não há qualquer manifestação popular em defesa dessa instituição. Mais ainda, não há sinergia entre as partes. Não há Res Publica.

(Será por que o Direito entre nós é historicamente elitista e representa, via de regra, a vontade dos mais fortes e está, na esmagadora maioria dos casos, a serviço do que se convencionou chamar elite no Brasil?).

Voltando a Eduardo Bolsonaro, se não há, de fato, Res Publica, ou coisa pública, basta mesmo um cabo e um soldado para fechar o STF. Sem a legitimidade dada pelo reconhecimento e o apoio da população, os seus 11 ministros são apenas senhores eruditos citando leis, com a devida vênia. Daí, a empáfia do bolsonarismo.

É a ausência do clamor popular à altura que está dando a Bolsonaro e filhos espaço para os desmandos que eles vêm cometendo, inclusive no tocante à pandemia do coronavírus. Num país deveras republicano, em pleno funcionamento de seu estado democrático de direito, eles provavelmente já estariam respondendo na letra da lei.

É preciso repetir que, desde sempre, a esmagadora maioria do povo brasileiro vem sendo mantida à margem por um bem elaborado projeto de exclusão político-social que passa pela educação, cultura, saúde pública, trabalho, concentração de renda, etc. O salário mínimo aviltante, por exemplo, é uma poderosa arma de exclusão e alienação que mantém o trabalhador com o mínimo para não morrer de fome (se é que dá) e o mantém em perpétua letargia. Como falar em cidadania, em identificação como membro efetivo do Estado nessa situação de tamanha indigência?

Não pode haver na República instituições a ela associadas, em qualquer nível de poder, que funcionem independentemente da vontade soberana do povo. Se assim o for, tem-se uma democracia de fachada, que começa e termina no voto, que, como já vimos, pode ser manipulado.

De direito, o Brasil é Res Publica, é coisa pública, democrática, está na Constituição. Para fazer cumpri-la em rigor, só a voxpopuli, soberana, ocupando todos os espaços, em alto e bom som, inviabilizando toda e qualquer ameaça de totalitarismo.

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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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