Câmeras inoperantes do Olho Vivo preocupam população

Em dezembro de 2014, quando as 54 câmeras do programa Olho Vivo começaram a funcionar, em Juiz de Fora, foram utilizados recursos de cerca de R$ 5 milhões do Governo do Estado. O dinheiro fazia parte de um pacote de R$ 50 milhões para implantação de cerca de 800 novos aparelhos em várias regiões de Minas. Para essa empreitada, coube à Prefeitura arcar com os custos mensais de monitoramento. Os equipamentos chegaram com o objetivo de contribuir para a redução da criminalidade. Com tecnologia de infravermelho, os aparelhos têm capacidade de gravar imagens em alta resolução, inclusive no período noturno, além de rotação de 360 graus, o que permite controle total de toda a área vigiada. A vigilância, como previsto, era para ser realizada durante 24 horas. Todavia, com o passar do tempo, essa meta tem ficado cada vez mais difícil de ser cumprida. Em 2017, por exemplo, o sistema ficou nove meses com 37 câmeras sem funcionar por falta de manutenção. Somente em janeiro de 2018, o serviço voltou a operar totalmente. Atualmente, a situação se repete. A Prefeitura admite que os equipamentos não estão funcionando em determinados locais e aguarda a conclusão de trâmites burocráticos para que a empresa Nexare, de Belo Horizonte, vencedora da licitação para o serviço de manutenção, avalie o problema.

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Cruzamento da Getúlio Vargas com a Rio Branco é uma das zonas quentes de criminalidade com monitoramento (Foto: Fernando Priamo)

Os pontos de instalação das câmeras em Juiz de Fora foram estabelecidos pela Polícia Militar local, em conjunto com a Diretoria de Tecnologia e Serviço da PM, de Belo Horizonte. Foram levados em conta estudos estatísticos de zonas quentes de criminalidade no município, dados de crimes contra o patrimônio por área e viabilidade técnica do ponto escolhido.

Apuração da Tribuna junto ao sistema de Registros de Eventos de Defesa Social (Reds) mostra que, em diversos pontos do município onde as câmeras estão instaladas, principalmente na região central, os equipamentos estão inoperantes. Em 26 de março deste ano, ao registrar um crime de roubo, em um ponto de ônibus, no cruzamento da Avenida Rio Branco com a Rua Benjamin Constant, no Centro, quando uma mulher foi agredida e roubada por assaltantes, a Polícia Militar relatou que, ao tentar pesquisar sobre os suspeitos do assalto junto às câmeras do Olho Vivo, constatou que os equipamentos estavam inoperantes. No início do ano, em 31 de janeiro, uma dupla abriu a cabine de um caminhão, estacionado na esquina das ruas São Sebastião com Batista de Oliveira. Foi usada uma chave micha para furtar R$ 1.500 da carteira que o motorista deixou no interior do veículo. No boletim de ocorrência consta que as câmeras do local estavam sem funcionar.

A mesma situação aconteceu em 4 de dezembro de 2018, no Bairro Manoel Honório, na Zona Leste, onde uma idosa, de 64 anos, foi vítima de furto, na Praça Alfredo Lage. A mulher estava sentada no local, quando teve a bolsa arrancada de suas mãos e levada por uma dupla. Ela tinha feito um saque em uma agência bancária no valor de R$ 680. O dinheiro foi embora junto com a bolsa. A idosa relatou aos policiais que suspeitava de um homem e de uma mulher que estavam próximos dela no interior do banco. Os policiais solicitaram apoio das imagens do Olho Vivo para localizar os autores do crime, mas as câmeras estavam inoperantes.

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Outro ponto de grande movimento com monitoramento de câmeras está na esquina da Avenida Rio Branco com Rua Espírito Santo (Foto: Fernando Priamo)

Em 29 de setembro do ano passado, quando, ao registrar o caso em que um morador de rua foi esfaqueado, próximo ao cruzamento da Avenida Rio Branco com a Rua Espírito Santo, no Centro, a Polícia Militar, que foi acionada a fim de localizar o suspeito de cometer o crime, também relatou que os equipamentos das imediações não funcionavam. Recentemente, em matéria sobre a situação de tráfico de drogas e de furtos frequentes no Parque Halfeld, na região central, o comandante da 30ª Companhia de Polícia Militar, capitão Leonardo Coelho de Medeiros, afirmou à Tribuna que três câmeras do programa Olho Vivo, que colaboram para o monitoramento do logradouro, estavam desligadas.

Para a população, o pleno funcionamento do sistema é de suma importância para a inibição de crimes e também para que as forças policiais consigam chegar até aos criminosos e efetivar suas prisões. Esse êxito fica evidente em diversas ocorrências ao longo do ano e também nas coberturas realizadas pelo jornal, como, por exemplo, em dezembro do ano passado, quando as câmeras colaboraram para a detenção de dois jovens, de 18 e 19 anos, que promoviam pichações em diversos pontos no Centro.

A dupla foi capturada após pichar a fachada de um estabelecimento na Rua São João. Com eles, a PM localizou três latas de tinta em spray, um pincel e dois frascos de corante líquido, além de um cigarro de maconha. Quando o programa foi inaugurado, das 54 câmeras instaladas, 22 foram espalhadas em ruas e esquinas do Centro e outras 16 na Zona Sul, em áreas de grande concentração de pessoas devido ao comércio e ao movimento de bares à noite. Os demais dispositivos foram divididos entre Zona Leste, Norte e Cidade Alta. Os endereços de localização dos aparelhos não foram divulgados por questões de segurança. O monitoramento é feito por profissionais de uma empresa contratada por meio de licitação e supervisionado por militares, em uma central instalada na sede do 2º Batalhão da PM.

A 4ª Região de Polícia Militar destaca que o videomonitoramento proporcionado pelo Olho Vivo contribui para o aumento da sensação de segurança subjetiva do público e para a melhoria da qualidade de vida da comunidade. Este ano, de acordo com a corporação, entre os meses de janeiro, fevereiro e março, foram registrados 109 empenhos da PM por conta do monitoramento das câmeras, resultando em 20 prisões.

Comerciantes denunciam tráfico no Manoel Honório

No caso da Praça Alfredo Lage, no Manoel Honório, comerciantes do entorno não tinham notícia sobre a falta de funcionamento das câmeras do Olho Vivo. Todavia, relataram que a situação do logradouro é grave e denunciam a ocupação do lugar pelo tráfico e uso de drogas. O dono de um comércio no local, que pediu para não ser identificado porque teme sofrer retaliação, disse que a venda de entorpecente acontece durante o dia e a noite. “Eles fumam maconha na frente de todos e sem cerimônias, principalmente na parte da tarde. A gente vê quando a droga é vendida e toda a movimentação que é feita para que o tráfico aconteça. Isso tem prejudicado muito o comércio da praça. As pessoas já estão evitando circular por aqui. Sem falar na depredação do patrimônio público, pois o piso está todo danificado”, diz o comerciante.

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Região do Bairro Manoel Honório é uma das que possui vigilância eletrônica (Foto: Olavo Prazeres)

Outro proprietário de estabelecimento comercial, que também pediu para não ser identificado, contou que a praça inspirava mais segurança e que hoje ela está tomada por pessoas em atitude suspeita. “Me lembro quando a câmera foi instalada e, naquela época, não era assim, inclusive existia a presença de policiais com mais frequência. Atualmente, não posso afirmar se o equipamento está funcionando ou não, mas é certo que a praça foi tomada por traficantes. E eles se acham livres para atuar no local, pois não se sentem inibidos pela câmera, e a situação é agravada quando não tem patrulhamento”, afirma.

Empresa vai avaliar situação dos equipamentos

O secretário de Segurança Urbana e Cidadania da Prefeitura, José Sóter de Figueirôa, afirma que, ao assumir a pasta, em dezembro de 2018, a inoperância dos equipamentos foi detectada e iniciado o processo de contratação de uma empresa especializada para o serviço de manutenção, uma vez que se trata de equipamentos sensíveis e de tecnologia sofisticada. A licitação foi concluída no final de janeiro deste ano, quando a Nexare saiu vencedora do certame. Segundo o secretário, está em fase de preparação um termo de referência, ações de trabalho e confecção de um contrato entre a Prefeitura e a empresa, para que a assinatura seja feita e os serviços possam ter início até o final do mês de maio. “A empresa estabeleceu um valor médio estimado, mas, agora, é preciso avaliar câmera por câmera, a fim de que seja verificado o tipo de problema que apresentam. Às vezes, é apenas uma questão de lubrificação, porque elas funcionam 24 horas por dia, ou uma peça que precisa ser trocada ou ainda problemas na fibra ótica”, afirma Figueirôa, acrescentando que o valor estimado para a contratação da empresa foi baseado em 15 câmeras, mas, só ao final do trabalho de verificação dos equipamentos, poderá se saber exatamente o número de equipamentos inoperantes.

Mas ele estima que o número possa ser menor do que em 2017, quando 37 câmeras ficaram sem funcionar por um longo tempo, e uma empresa não especializada realizou os serviços de manutenção. Além do investimento do governo estadual para instalação do Olho Vivo na cidade, segundo Figueirôa, cabe à Prefeitura os custos relacionados à utilização dos postes onde as câmeras estão instaladas pagos à Cemig, a contratação da empresa que faz o monitoramento, acompanhando captação das imagens; e a manutenção dos equipamentos, totalizando cerca de R$ 1,3 milhão, por ano, para manutenção do videomonitoramento.

Sensação de segurança
José Sóter Figueirôa pontua que existe a intenção, por parte da Prefeitura, para ampliar o programa para mais bairros de Juiz de Fora, pois existe uma demanda da sociedade. Contudo, ele pondera que a empreitada tem altos custos. “Hoje a Prefeitura não tem condições para ampliar e atender essa demanda com recursos próprios. No entanto, estamos confabulando, de maneira preliminar, um diálogo com o Governo federal no sentido de conseguir essa ampliação. Temos um projeto elaborado, chamado JF mais segura, que é mais amplo e tem foco na participação popular, na integração com as forças de segurança, no fortalecimento da Guarda Municipal e na criação do Centro Integrado de Segurança Pública, a exemplo do que existe no Rio de Janeiro, Volta Redonda (RJ), Contagem e Belo Horizonte. No contexto desse projeto, vamos solicitar recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para viabilizá-lo e ampliar esse videomonitoramento, pois foi comprovado que, por meio dele, a sensação de segurança aumentou, além da redução de crimes contra o patrimônio”, ressalta.

O secretário adiantou que, caso o projeto seja concretizado, serão solicitadas 30 câmeras ao Governo federal. “Além disso, para custear essa iniciativa, pensamos em uma parceria público-privada com empresários, como funciona em Volta Redonda, já que há o interesse do empresariado pela implantação desses equipamentos, assim há o alívio para os cofres públicos”.

Operação para cumprimento de objetivos

Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas, Robson Sávio, observa que, como há o dispêndio de verba pública para que o Olho Vivo funcione, os órgãos envolvidos têm que ter o compromisso de fazer o sistema operar adequadamente, cumprindo os seus objetivos, como é esperado pela população a fim de haver a sensação de segurança oferecida pelas câmeras e, principalmente, para utilização na prevenção e repressão ao crime.

O especialista também pondera que o êxito dos equipamentos só acontece se estiver aliado a outros fatores, como a pronta resposta. “As câmeras por si apenas representam uma ideia de sensação de segurança, mas, para cumprir o seu objetivo de inibição da criminalidade e eventuais práticas de repressão à criminalidade, é preciso que sejam operadas e tenham um sistema de controle, que deve ser feito por um órgão da polícia ou da Prefeitura, e ter equipes de pronta resposta. Não adianta ter uma série de câmeras funcionando se não há essa pronta resposta, se não têm os órgãos de segurança atuando de forma imediata a partir do momento que se constata uma contravenção ou até crime”, ressalta Sávio.

Eficácia
Em todo o Estado, a média de redução de crimes contra o patrimônio nas áreas de instalação do Olho Vivo varia de 30% a 40%, como assinala a Secretaria de Segurança Pública (Sesp). Robson Sávio pontua que, geralmente, esses equipamentos têm bom funcionamento quando estão colocados em zonas quentes de criminalidade e são acompanhados por equipes de controle durante o tempo todo. “Essas ferramentas também cumprem papel importante na investigação de crimes, porque podem oferecer pistas para os investigadores e ajudar na elucidação dos crimes. Isso depende da câmera estar funcionando assim como todo o sistema, que envolve até o processo de gravação de imagens, para que sejam requisitadas, posteriormente, para a prática investigatória. Dessa forma, é importante compreender o sistema como um todo. A câmera só tem efetividade combinada com esses outros fatores”.

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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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