Casos de Covid-19 mais que dobram neste mês em JF

O súbito aumento de casos confirmados de infecção pelo coronavírus em Juiz de Fora chamou a atenção na última semana, conforme os dados disponibilizados pela Prefeitura diariamente no site covid19.pjf.mg.gov.br. No intervalo de apenas sete dias, os números saltaram de 894 infectados, no dia 15, para 1.108 no dia 18, chegando a 1.244 no dia 19, quando atingiu o ápice dos sucessivos recordes de testes positivos em apenas 24 horas, com mais 136 casos em um único dia. Com a tradicional queda das confirmações nos fins de semana, a estatística permaneceu, até o último domingo (21), em 1.258 casos e 47 óbitos atestados.

O acréscimo de 364 infectados nos dados oficiais do Município, na semana passada, representa 28,9% do total de casos confirmados na cidade desde o início da pandemia, há cerca de três meses. Isso significa que quase 30% das pessoas que testaram positivo para Covid-19 foram contaminadas recentemente, indicando um crescimento vertiginoso da doença e uma inclinação ainda maior da curva, que permanece ascendente nesses cerca de cem dias. Outro fator que reforça essa ideia é que a quantidade total de contaminados mais que dobrou neste mês de junho, já que a cidade tinha 615 pessoas positivadas até 31 de maio.

O levantamento preocupa especialistas, o Ministério Público e a própria Prefeitura, sobretudo porque, até o fim de semana, a taxa de ocupação dos leitos de UTI SUS ultrapassava a marca dos 80%, chegando a 80,12%, enquanto a média total, levando-se em conta também as UTIs privadas, era de 71,05% de uso dos 266 equipamentos existentes, restando 77 vagas. No mesmo período analisado, a taxa de isolamento social aferida pela Prefeitura de Juiz de Fora ficou abaixo dos 50% mantidos desde as primeiras medidas de restrição, sendo a média dos últimos sete dias de 49,45%.

Para o infectologista Guilherme Côrtes, o cenário revela que Juiz de Fora pode estar perto de atingir “o primeiro grande pico” de vários que podem acontecer. “Não acredito que venhamos a enfrentar somente um pico, por tudo o que temos visto de características da epidemia no mundo todo. Mas o primeiro pico sim, estamos prestes a chegar, com risco iminente de colapso do nosso sistema de saúde. Estamos com poucas vagas, principalmente no sistema público de saúde, apesar de todas as restrições de procedimentos eletivos.”

Na análise do especialista, esse incremento no número de infectados, com a aceleração observada na última semana, só tende a ser maior. “Deve começar a dobrar o número de casos a cada dez dias, mais ou menos. Com isso, tendemos a saturar muito rapidamente, levando ao colapso do sistema de saúde. Ou seja, não temos como aumentar o número de leitos na mesma velocidade em que é observado o aumento de casos, com aceleração da curva epidêmica.”

Infectologista defende aumento de isolamento e de testagem

Diante das previsões nada otimistas, o infectologista acredita que “a única maneira de conseguir controlar a epidemia é com o isolamento social: “De fato, na nossa cidade, não fomos efetivos. Não funcionou o isolamento social como deveria ter funcionado. Com isso, a transmissão continua acontecendo. Certamente, este é o momento de intensificarmos as ações de isolamento social. É o momento de lockdown para conseguirmos, de fato, controlar a epidemia e estruturar efetivamente as ações que possibilitem a abertura, a flexibilização.”

Essas ações, segundo Côrtes, inclui a “ampliação de testagem nas comunidades, não somente nos hospitais, e estruturação de rastreamento de casos e de contactantes”. Ele acrescenta que o termo em inglês “contact tracing”, que ficou em voga atualmente e significa rastreamento de contato, é uma técnica realizada há décadas. “São as técnicas de vigilância epidemiológica. E se isso não for feito e se não ampliarmos a testagem, de fato não vamos ter estrutura para nenhuma flexibilização.”

O especialista é enfático ao dizer que esse afrouxamento do isolamento social só pode acontecer depois que conquistado o controle da epidemia, ainda não alcançado ao longo desses meses: “Dada essa aceleração, só controlamos a epidemia se intensificarmos as ações de isolamento social, com medidas mais restritivas, que são a do lockdown.”

Flexibilização com o Minas Consciente

Apesar de esse acréscimo de casos já ser previsto em determinado momento, Côrtes pondera que passou a ser “mais esperado por conta das medidas de flexibilização que ocorreram no último mês”. Após Juiz de Fora ter aderido ao programa do Governo estadual Minas Consciente, os bares, por exemplo, puderam ser reabertos na cidade por estarem incluídos na chamada “onde verde”, a mais restritiva de todas as quatro etapas. Os mesmos estabelecimentos foram obrigados a baixar as portas no último dia 12, após 28 dias em funcionamento, por meio de decreto do prefeito Antônio Almas (PSDB).

Nesta segunda-feira (22), durante transmissão on-line pelas redes sociais, o chefe do Executivo municipal demonstrou grande preocupação com o crescimento de contaminações na cidade. Após citar algumas estatísticas, Almas fez um apelo: “Pelo amor de Deus, fique em casa!”. O pedido veio acompanhado de relato sobre as dificuldades enfrentadas pela Prefeitura na ampliação de leitos de UTI e do contínuo trabalho para salvar vidas.

Ansiedade para reabertura

Citando como exemplo os Estados Unidos, o infectologista Guilherme Côrtes avalia que “a ansiedade de reabertura econômica, sem dúvida, tem sido apontada como a principal causa de aceleração das curvas epidêmicas”. Segundo ele, a reabertura ocorrida ao longo do último mês na cidade contribuiu para esse avanço. “Associado a isso, há uma estratégia de testagem pouco efetiva. Não testamos a comunidade. Não sabemos como está a transmissão da doença nos nossos bairros, de fato. Só estamos olhando os pacientes mais sintomáticos ou aqueles que têm maior acesso a laboratório privado.”

O especialista enfatiza que o avanço de infectados não teria relação com maior realização de testes, como chegou a ser ponderado pelo prefeito, que também admitiu que o índice de contágio médio está alto. “Absolutamente não. A testagem na nossa cidade é muito baixa”, destaca Côrtes.

MP solicita diretrizes diante do “quadro de rápida evolução”

O coordenador regional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde, Rodrigo Barros, também demonstra inquietação diante da elevação de infectados pelo coronavírus em Juiz de Fora. De olho não apenas na cidade, mas em toda macrorregião polarizada pelo município – que inclui mais 93 cidades e população estimada em 1,6 milhão de habitantes -, o promotor garante que o Ministério Público está acompanhando atentamente os dados epidemiológicos/assistenciais da Macrorregião Sudeste. “De fato, percebe-se um crescimento mais rápido do número de casos confirmados e suspeitos”, diz ele sobre o levantamento da última semana.

Segundo o promotor, a situação de avanço da Covid-19 não acontece apenas em Juiz de Fora. “Conforme verificado nos últimos boletins divulgados pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), através do COES (Centro de Operações de Emergência em Saúde) Estadual, a Macro Sudeste encontra-se em uma curva ascendente de novos casos, sendo que nos comparativos das duas últimas semanas apresentou taxa de incidência por 100 mil habitantes de 43,2 (semana do dia 7 de junho) e de 49,3 (semana do dia 14 de junho).”

Já sobre a ocupação de leitos de UTI adulto e de UTI Covid adulto SUS, Juiz de Fora, com a média variável de ocupação de 78% a 80%, “está um pouco acima da média de ocupação macrorregional, que vem se apresentando em torno de 68%”. O promotor ressalta que as cirurgias eletivas ainda encontram-se suspensas perante os prestadores SUS, “o que vem impactando favoravelmente em tal taxa de ocupação”.

“Diante de tal cenário epidemiológico/assistencial, o MPMG solicitou a inclusão de pauta na próxima reunião (a ocorrer nesta terça, 23 de junho) do Comitê Municipal Covid-19, no sentido da análise pelo grupo técnico formado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e Prefeitura, e que conta com pesquisadores, médicos epidemiologistas, entre outros, possibilitando a apresentação de diretrizes ante ao quadro de rápida evolução do número de casos, evitando-se um estrangulamento da rede assistencial que até o momento encontra-se estabilizada.”

Dessa forma, o promotor busca, junto ao comitê, meios de evitar o colapso do sistema de saúde. “Como é de amplo conhecimento, o Município aderiu ao plano de retomada das atividades econômicas proposto pelo Estado de Minas Gerais, denominado Minas Consciente, estando a Macrorregião Sudeste inserida na onda verde (atividades essenciais). Porém, como já deliberado pela própria coordenação do Minas Consciente, os entes municipais possuem autonomia para serem mais restritivos ante às peculiaridades locais, e tal perspectiva deve ser levada em consideração quando constatadas atividades e regiões que propiciem aglomeração de pessoas”, finaliza o coordenador.

Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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