Democracia representativa e redes sociais

A democracia representativa vem sofrendo, no Brasil, o impacto das redes sociais, que, além e à margem da Constituição, parecem forjar novos meios de participação popular. Os instrumentos de que esta pode valer-se, do ponto de vista das instituições vigentes, são o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular na elaboração das leis. O primeiro tem o caráter de consulta ao eleitorado, suscetível de estabelecer diretriz para uma lei subsequente; o segundo consiste em submeter uma deliberação do Legislativo à ratificação, ou não, dos eleitores; e a iniciativa popular se processa segundo as regras de admissibilidade que a Carta Política prescreve.

O que o uso das redes sociais vem mostrando é que, por meio delas, se abre ao cidadão a possibilidade de influir em comportamentos de seus representantes acerca de temas pendentes de apreciação pelos poderes da República. Antes de tudo, as redes sociais têm representado uma forma de expressão da opinião pública, constituindo um poderoso meio de expressá-la direta e prontamente e sendo capaz, assim, de influir, até mesmo, no resultado das eleições, como se viu no último pleito presidencial. Não se pode negar que, sob esse aspecto, constituem um instrumento positivo para a apuração da vontade do povo. De outro lado, porém, as redes sociais podem prejudicar o funcionamento do regime democrático, na medida em que sejam contaminadas pelas chamadas fake news ou tornem os representantes do povo, no Legislativo ou no Executivo, dependentes de seu uso para a tomada de decisões da sua competência.

As notícias falsas não surgem apenas em função desses novos meios de comunicação, mas estes, pela sua força e pelo seu largo alcance, podem dar-lhes expansão mais nociva do que antes tinham. Já o segundo inconveniente apontado pode gerar, sim, uma deturpação da democracia representativa, o que é preocupante. Senadores, deputados e vereadores ficam, não raro, condicionados às mensagens que lhes chegam para formar sua convicção e votar nas matérias submetidas às Casas em que têm assento. E tais manifestações, colhidas nas redes sociais, resultam do calor do momento, com toda a carga de improvisação e emoção que isso produz. Além do que, em vez de cumprirem sua missão de líderes, procurando não só expressar a vontade do eleitorado, mas também sobre este influindo, nos assuntos mais complexos, os representantes do povo se sujeitam, assim, ao papel de meros procuradores de eventuais entendimentos ou de interesses ocasionais. A eleição para a mesa do Senado deixou isso, aliás, bem claro.

Sem dúvida, as redes sociais podem contribuir para o aperfeiçoamento do regime representativo. Mas não se destinam a substituir as formas consagradas para o seu exercício. Estas pressupõem, fundamentalmente, a existência de partidos políticos autênticos, que possam atuar como elos entre o cidadão e os poderes públicos, em vez de servirem apenas de órgãos cartoriais destinados a atender às exigências da legislação eleitoral. Ademais, o país anseia pelo surgimento de grandes lideranças, capazes de valorizar e dar dignidade à vida pública. A política, exercida com esse sentido, é da essência da democracia. Quatro séculos antes de Cristo, Péricles, o grande orador da velha Atenas, já advertia para a circunstância de que o cidadão desinteressado da política é um ser inútil à sociedade e à pátria. Por meio das redes sociais, também se exerce a política, sem desprezo, porém, dos políticos, antes, contribuindo para que estes cumpram sua missão, com legitimidade, independência e altivez.

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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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