Estudantes de medicina de JF buscam antecipar a formatura

Nesta segunda-feira (6), o Ministério da Educação (MEC) publicou portaria autorizando a formatura antecipada de estudantes de Medicina, Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia do sistema federal de ensino. O documento regulamenta a Medida Provisória (MP) 934, publicada em 1º de abril, que facilita a abreviação dos cursos. Entretanto, os discentes ainda dependem que suas respectivas instituições aceitem a solicitação. Em Juiz de Fora, pelo menos 140 estudantes do 12º período de medicina buscam meios de antecipar a formatura para auxiliar no combate ao coronavírus. Os dados são da Federação Internacional de Associações de Estudantes de Medicina (IFMSA) e contabiliza alunos da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz de Fora (Suprema).

De acordo com a publicação do MEC, os estudantes de Medicina poderão se formar ao concluir 75% do internato, enquanto alunos de enfermagem, farmácia e fisioterapia, no momento em que cursarem a mesma porcentagem do ensino curricular obrigatório. Com caráter excepcional, a deliberação valerá enquanto durar a situação de emergência na saúde pública e servirá exclusivamente para atuação no combate ao novo coronavírus.

As medidas do Governo federal foram resultados de um movimento nacional de estudantes de medicina. Em Juiz de Fora, a mobilização se iniciou logo após as aulas serem suspensas, de acordo com o aluno do 12º período da Faculdade de Medicina da UFJF, Caio Henrique Bosquetto. “Nós estávamos nos mobilizando no sentido de tentar antecipar a formatura para poder trabalhar na linha de frente contra a pandemia”, explica. “Em um primeiro contato com a UFJF, expressamos nossa vontade de querer antecipar nossa formatura, uma vez que a gente já cumpria a carga mínima horária prevista pelo MEC, de 7.200 horas no curso de Medicina, e 2.700 horas do internato.” Ainda conforme Caio, os estudantes estavam cogitando judicializar para conseguir se formar antes, entretanto, resolveram aguardar resposta por parte do Governo federal, que veio através da MP. Segundo levantamento da IFMSA, a turma do 12º período de medicina da UFJF conta com 86 alunos.

O Diretório Acadêmico (D.A.) da Medicina da UFJF se reuniu com representantes da Faculdade de Medicina (Famed) na última semana, para debater os possíveis desdobramentos da MP 934, entretanto, apenas a gestão superior da instituição pode deliberar a antecipação da formatura, de acordo com a presidente do D.A., Letícia Sabrina Neves. Desta forma, como há desejo entre os estudantes do 12º período para abreviar o curso, a representação dos discentes tem buscado contato com outras organizações que possam auxiliá-los, como o Diretório Central dos Estudantes (DCE) e a Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (Denem). “Estamos em contato com o DCE. Ontem fizemos reunião também com a Denem, que é o órgão máximo a nível nacional que pode nos ajudar nisso. Eles estão em contato com advogado deles porque são várias escolas médicas correndo atrás do mesmo objetivo.”

Demais instituições

A portaria publicada pelo MEC abrange estudantes apenas da rede federal de ensino. Como destaca o advogado especializado em Direito Médico, Caio Tirapani, a portaria regulamenta a MP 934 com um requisito extra: os estudantes devem atuar exclusivamente nas ações de combate à pandemia do Covid-19. Já as demais instituições, como estaduais e particulares, podem se basear na MP, que autoriza a antecipação da colação de grau. “O Ministério da Educação regulamentou como vai funcionar para as instituições federais, elas vão poder se adequar à medida provisória, mas desde que cumpra esse requisito. As outras instituições não estão presas a isso. Elas estão vinculadas só à medida provisória”, explica Tirapani.

Conforme o advogado Caio Tirapani, como é apenas uma autorização, as instituições não estão obrigadas a adiantar a colação de grau (Foto: Divulgação)

Conforme o especialista, como é apenas uma autorização, tais instituições não estão obrigadas a antecipar a colação de grau. “O aluno, ainda assim, vai depender da vontade da instituição. Se a instituição estiver de acordo, ver que ele cumpriu os requisitos e for favorável a essa política, ela vai antecipar”, diz. “(A medida provisória) não gerou uma obrigação para as instituições, e sim uma possibilidade, porque muitas instituições estavam querendo colar o grau desses alunos, mas estavam sentindo falta de um amparo legal, porque não tinha nada na lei que autorizasse, agora elas têm essa liberdade por conta dessa medida provisória.”

Na Suprema, a turma do 12º período de medicina conta com 54 estudantes, de acordo com a IFMSA. Segundo a aluna Ana Vitória Chequer Saraiva, a maioria dos discentes se demonstra favorável à antecipação. Antes mesmo da medida provisória, a turma buscava um parecer da faculdade por conta do número de horas mínimas. “Até falaram que a gente teria as horas mínimas, mas o que estaria impedindo eram os dias letivos. Aí saiu essa medida provisória nos liberando desses dias letivos: quem tivesse 75% do internato poderia formar, no caso, seria o 12º período. A gente entrou em contato com a faculdade através da representante de turma para saber uma posição deles. O que foi passado é que eles não tinham se reunido ainda, então estamos aguardando uma resposta da faculdade.”

Mais de seis mil estudantes brasileiros de medicina buscam abreviar curso

Após a suspensão das aulas nas universidades brasileiras, a IFMSA buscou maneiras de debater a formação antecipada em âmbito nacional. Para isso, a Federação reuniu documentação com representantes de cada turma interessada, informando o número de discentes e qual a situação de cada faculdade. Em todo o Brasil, mais de seis mil estudantes, de cerca de 150 faculdades de medicina, buscam antecipar suas formaturas. Com o auxílio da Sociedade Brasileira de Direito Médico e Bioética (Anadem), a IFMSA protocolou a documentação junto aos ministérios da Saúde e da Educação, de acordo com a aluna do 12º período da Universidade do Estado do Pará e integrante da Federação Internacional das Associações de Estudantes de Medicina, Maitê Gadelha. “Nós sabemos que, a nível de Brasil, tem muita disparidade até no quesito de educação, no quesito de quais estágios faltam para um e faltam para outros. Aqui na minha situação, por exemplo, nós iríamos ter aula até dia 30 de maio. Nós estamos totalmente parados, sem previsão de volta, e realmente acreditamos que somos necessários nesse momento para a sociedade”, diz Maitê.

De acordo com a representante da IFMSA, mesmo com avanços em algumas universidades, ainda há resistência de outras. “De acordo com a medida provisória, já devíamos ter acesso a isso [formação], mas das faculdades, não são todas que estão auxiliando o processo. Então, agora, estamos nessa conversa junto com as faculdades e com os alunos para tentar auxiliar todo mundo da melhor forma possível”, explica. “Reconhecemos que, assim como todo recém-formado, vamos ter nossas dificuldades, mas nós temos que ter a oportunidade também para trabalhar e dar nosso melhor. Queremos estar dispostos a trabalhar aonde for necessário, até porque não faltam médicos só na frente de trabalho contra o coronavírus. Falta gente para trabalhar nas UBSs, nos interiores também. Tem que dar uma assistência completa para a sociedade nesse momento, é isso que a gente está reivindicando.”

Governo lança edital de estágio

Paralelamente à MP, o Ministério da Saúde lançou edital para estudantes da área de saúde atuarem em estágio no enfrentamento ao coronavírus no Sistema Único de Saúde (SUS), por meio do projeto “O Brasil conta comigo”. Podem se inscrever alunos matriculados em instituições de ensino superior, públicas e privadas, que integram o sistema federal de ensino, cursando o 5° e 6° ano de Medicina, além de alunos do último ano dos cursos de graduação em enfermagem, fisioterapia e farmácia.

Os estudantes podem se inscrever no programa por meio do link sgtes.unasus.gov.br/apoiasus. Ao ser convocado, por meio de e-mail, o candidato deverá se apresentar em até 48 horas no estabelecimento de saúde indicado. Os alunos poderão atuar, também, nas áreas de clínica médica, pediatria e saúde coletiva, de acordo com as especificidades de cada curso. Todos serão supervisionados por profissionais de saúde de suas respectivas áreas. Aqueles que forem convocados pelo edital irão integrar um cadastro vinculativo, com cárter de compromisso para futuro recrutamento, de acordo com a necessidade dos gestores do SUS, considerando o contexto de emergência em saúde pública.

Faculdades se manifestam em relação à medida provisória

A UFJF segue o posicionamento da Faculdade de Medicina (Famed), que por meio do Conselho de Unidade, da Coordenação de Curso, da Comissão Orientadora de Estágios e o Núcleo de Apoio às Práticas Educacionais da Famed, “não recomendam aos alunos do 12º período anteciparem suas formaturas, uma vez que a formação médica estaria incompleta, causando prejuízos em suas atuações futuras. Ademais, ainda não é possível definir a segurança de se obter um registro profissional definitivo.”

Entre as justificativas está o projeto pedagógico do curso. Mesmo que os alunos que colariam grau em julho de 2020 tenham cumprido 81,5% da carga horária do estágio, a instituição informa que a alocação dos mesmos em serviços de pediatria, saúde coletiva ou clínica médica “não supriria as habilidades e as competências que são necessárias e desenvolvidas nos cenários de prática habituais”.

A Famed chama atenção, também, para o artigo 2º da portaria do MEC, que diz que a carga horária dedicada pelos estudantes deverá ser computada para que, posteriormente, obtenham registro profissional definitivo. Assim, para atuar no combate ao coronavírus, os discentes teriam um registro profissional provisório. A instituição questiona o que aconteceria com os estudantes caso os mesmos sejam acometidos pela doença e não completem a carga horária devida. “Ora, ele já colou grau e não cumpriu os critérios para obtenção do registro profissional definitivo. Não pode retornar à Faculdade, pois dela já não é aluno, nem exercer a profissão, pois não terá o registro definitivo.”

Em relação ao programa de estágio, a Famed também não aconselha os estudantes a participarem. “As condições atuais de disponibilização de EPIs e a não garantia de supervisão individual nos impelem a também não recomendar o estágio voluntário. Mudanças futuras no cenário epidemiológico e de insumos para atendimento ao coronavírus podem levar a Faculdade de Medicina a rever esta posição.”

Já a Suprema, em nota, informou estar ciente da portaria do Governo federal, entretanto, ainda não possui um posicionamento sobre o tema. A Tribuna também tentou contato com a Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac-JF), mas não teve retorno.

Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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