Mais de 260 animais silvestres são recolhidos em JF e região em 2019

Animais recolhidos, como as aves, são retirados do meio urbano e reintegrados à natureza (Foto: Concer/Divulgação)

Ao menos 180 animais silvestres já foram resgatados em Juiz de Fora e região no ano de 2019. Somados aos 83 atropelamentos registrados na região, os números refletem o impacto da intervenção humana na vida silvestre. Enquanto uma parte é encontrada às margens de estradas, onde estão sob risco de acidente, um número ainda maior é retirado do meio urbano e reintegrado à natureza. Por um lado, as queimadas e o avanço das ocupações urbanas obrigam o deslocamento da fauna, por outro, as cidades não se adaptam aos animais. Diante deste cenário, a Tribuna buscou dados e falou com especialistas para entender a relação humana com a fauna local.

Segundo a Polícia Militar de Meio Ambiente, foram recolhidos, de 1º de janeiro a 14 de agosto deste ano, 165 animais em toda a área da 4ª Cia PM MAmb, sendo a maior parte em área urbana. Sessenta e quatro deles foram resgatados em decorrência de algum tipo de intervenção ambiental, como queimadas e empreendimentos imobiliários. Entre eles, estão maritacas (12), gambás (14), ouriços (4), serpentes (26), lobo (1), jaguatirica (1) e micos (6). Outros 101 foram recolhidos por estarem fora de seu habitat natural. Os animais resgatados são levados para o Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) do Ibama/IEF, onde são avaliados e, caso estejam feridos, recebem tratamento veterinário, são reabilitados e reintroduzidos na natureza. Segundo o IEF, geralmente, são levados para seguimentos de Mata Atlântica, em estados bons de regeneração ambiental, no entorno de Juiz de Fora.

Segundo a analista ambiental do Instituto Estadual de Floresta da Regional Mata, Sarah Reis, cerca de 90% dos animais que chegam ao local são recolhidos por conta do chamado de algum cidadão.

“A maioria das vezes em que um animal se deixa ser capturado, é porque está com algum problema de saúde. No caso das aves, podem estar com fratura na asa, impossibilitados de voar, ou colidiram com algum obstáculo. No caso de saguis (mico-estrela), acontecem muitos casos de eletrocussão, porque andam nos fios. Recentemente recebemos uma cuíca pelo mesmo motivo.”

A especialista diz que há uma percepção errada de que o animal silvestre está fora de seu ambiente natural. “(As pessoas) acreditam que os animais silvestres deveriam estar apenas no meio das florestas. Mas as cidades se expandem para o meio das florestas, retirando-as. Na verdade, o que acontece é que muitos animais se adaptam com o meio urbano, como maritacas, tucanos e saguis. Se cresce uma cidade perto da mata, os animais menos tímidos podem tentar uma interação para conseguir benefícios, como alimentação e abrigo, ou fazer ninho no forro das casas. Mas muitas vezes as pessoas ligam para nós para retirar o animal e temos que passar a consciência da boa convivência: de dar espaço ao animal, não alimentar ou tocar. Esses animais têm o recurso que eles precisam, e se forem alimentados, vão se tornar dependentes dos humanos e se cortar o alimento, eles podem invadir as casas, o que causa reclamação.”

Sarah Reis explica como as intervenções humanas afetam a vida silvestre. “Quando se retira a camada superficial do solo e a vegetação, com certeza terá uma emigração dos animais daquele local. A própria presença de máquinas, na maioria das vezes, vai espantá-los. Quando se derruba uma árvore, não se sabe quantos ninhos têm nela, que comunidades usam aquela árvore para se alimentar ou como abrigo ou refúgio. E todas essas intervenções ambientais precisam ser autorizadas por Prefeitura, pelo Estado ou a União (no caso o Ibama), em caso de grandes proporções. Esse licenciamento prevê uma ação de resgate e realocação da fauna, e até reflorestamento.”

Mais de 80 atropelamentos na região de JF

Segundo a Concer, de janeiro a junho deste ano, houve 81 atropelamentos de animais no trecho mineiro da BR-040, de Juiz de Fora a Simão Pereira. “Os acidentes mais comuns envolvem gambás e aves, como anu-preto, porque ficam nas margens da rodovia, além de capivaras por conta de muitos trechos de rios. Também há morte de cobras cascavéis e coelhos tapiti”, explica a coordenadora de Meio Ambiente da Concer, Renata Villegas.

Neste período, a concessionária contabilizou seis resgates. Desses, três eram aves, sendo que duas, um anu-preto e um alma-de-gato, precisaram receber atendimento antes de serem soltas novamente. Os outros três foram mamíferos, sendo um bicho-preguiça e um tatu – que estavam em área de risco e foram transferidos para área segura -, além de uma jaguatirica que, após ser atropelada, não resistiu aos ferimentos.

Os animais feridos nesse trecho são encaminhados pela Concer a uma clínica particular de Juiz de Fora. Já a Via 040 informou o afugentamento e retirada de 12 animais silvestres – incluindo gambás, capivaras e tamanduás -, no trecho entre Barbacena e Juiz de Fora, entre janeiro e julho deste ano. A concessionária não informou o número de atropelamentos, mas ressaltou que o trecho possui placas indicando os pontos com possibilidade de travessia de animais silvestres. A Via 040 também advertiu que, “caso se depare com animais na pista, o usuário deve reduzir a velocidade, não buzinar e não jogar farol alto contra o animal”. Deve-se acionar as equipes da Via 040 pelo 0800-040-0040; da PRF, pelo telefone 191; e da Polícia Militar de Meio Ambiente, pelo 3228-9050.

Cerca de 90% dos animais que chegam ao local são recolhidos por conta do chamado de algum cidadão (Foto: PM Ambiental/Divulgação)

Segundo a Polícia Militar Rodoviária, geralmente não são feitas ocorrências de animais silvestres atropelados, já que os motoristas não notificam o acidente. Já a 4ª Cia da Polícia Militar de Meio Ambiente, encontrou apenas dois registros de atropelamento referentes a este ano. Um deles foi de um jabuti atropelado, em fevereiro, e um lobo-guará, que não resistiu aos ferimentos em agosto, na BR-120, km 663, na Serra de São Geraldo.

Pesquisa realizada entre agosto de 2018 e junho de 2019, pelo Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas, da Universidade Federal de Lavras (UFLA), estima que cerca de 2,1 milhão de animais de médio e grande portes são atropelados a cada ano no Brasil, inclusive dentro dos limites de áreas protegidas. O número chega a 450 milhões de mortes anuais em estradas, rodovias e ferrovias, se forem considerados também animais pequenos e vítimas fora de unidades de conservação.

Passagens ajudam a evitar acidentes

Buscando reduzir o número de acidentes com animais nas rodovias, têm sido construídas passagens de fauna em algumas estradas. A intenção é de que os animais possam atravessar as pistas de forma segura, seja por estruturas aéreas ou subterrâneas. No km 818 da BR-040, em Simão Pereira, por exemplo, uma passagem subterrânea que já existia desde a construção da rodovia foi adaptada e passou a ser monitorada por câmera fotográfica em 2011, já sob concessão da Concer. A adoção dessas estruturas, porém, ainda é muito recente no Brasil, assim como a preocupação com a ecologia de estradas, segundo a coordenadora de Meio Ambiente da empresa, Renata Villegas. Ela informou à Tribuna que a Concer tem mapeadas algumas áreas que são potenciais passagens de fauna, sobretudo na região da Serra de Petrópolis, “principalmente por conta das unidades de conservação, que são grandes fragmentos de Mata Atlântica”, explica. No entanto, para construí-las é necessária a autorização da Agência Nacional de Transporte (ANT).

“Atualmente a ANT não tem como prever o custo e repassar para a tarifa de pedágio. Recentemente, ela mandou uma circular para as concessionárias pedindo apoio para se criar um termo de referência e começar a fazer esse reequilíbrio econômico, que acontece quando a concessão faz o investimento e coloca o valor na tarifa de pedágio.” Atualmente, a empresa prevê a construção de dez novas passagens para quando for retomada a obra de duplicação da Serra de Petrópolis, do km 82 ao km 102, que foi iniciada no final de 2013, mas está embargada no Tribunal de Contas da União (CTU) desde meados de 2016.

Túneis subterrâneos e passagens aéreas destinados a animais na BR-040 são monitorados por câmeras. Imagens são usadas por especialistas, que podem desenvolver estratégias (Foto: Concer/Divulgação)

Renata Villegas explica que a tecnologia utilizada para auxiliar os animais depende das espécies e suas características comportamentais. “Temos mapeados quais trechos e quais tipos de animais que estão sendo impactados em cada quilômetro. Tem bichos, por exemplo, que não são escaladores, por isso, não utilizariam passagens aéreas, então a subterrânea é mais adequada”, explica. A medida influencia diretamente no índice de acidentes nas regiões onde há essas passagens. “Observamos que o índice de atropelamento tende a diminuir, principalmente porque colocamos cercas que direcionam a fauna para a passagem, evitando que os animais atravessem pela rodovia.”

O monitoramento dessas passagens é feito por câmeras e permite que pesquisadores observem o comportamento dos animais. “A paca, por exemplo, é um animal com locomoção mais lenta, utiliza bastante a passagem de fauna, e não é observado muito o atropelamento da espécie em rodovias. As jaguatiricas também utilizam e são territorialistas: quando elas passam, marcam seu território. Com isso, nos perguntamos se outra jaguatirica não irá utilizar a mesma passagem por conta da demarcação e observamos. Há animais que utilizam o túnel só durante a noite ou durante o dia. Tivemos muita incidência de incêndio em Minas este ano e, as jaguatiricas, por exemplo, que só utilizam a passagem à noite, começaram a passar também de dia. Esses dados são passados a pesquisadores da Universidade Veiga de Almeida e da PUC Rio, que utilizam as informações para pesquisas. Isso é importante até para estratégias futuras, de implantação de passagens.”

Mas há animais que parecem não se adaptar aos túneis e optam por se arriscar nas rodovias, como lobo-guará e onça-parda. “Mas não sabemos o porquê.” Por conta disso, este ano, a Concer resgatou, no trecho mineiro, um lobo-guará que sobreviveu e retornou à natureza, além de duas onças-pardas que não resistiram aos ferimentos. A carcaça dos animais atropelados são levados ao Museu Nacional do Rio de Janeiro para pesquisa e exposição de empalhados.

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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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