Quase 90% dos trechos da BR-040 ainda não foram duplicados

Dos 557,2 quilômetros da BR-040 que demandam obras de duplicação, no trecho entre Juiz de Fora e Brasília (DF), apenas em 73 quilômetros os trabalhos foram finalizados. Ou seja, 13,1% do total previsto no contrato de concessão firmado entre o Governo Federal e a Investimentos e Participações em Infraestrutura S/A (Invepar), empresa controladora da Via 040, que explora 936,8 quilômetros da rodovia. Dentro das obras de ampliação de capacidade e melhorias, o contrato prevê também a conversão de subtrechos em multifaixas para via duplicada, como em áreas entre Barbacena e Juiz de Fora, que contam com quatro faixas de tráfego (multifaixas), sem separação central. As intervenções, entretanto, ainda não foram iniciadas, sendo que 144,8 quilômetros devem ser convertidos. Para se ter uma ideia, dos cerca de 270 quilômetros entre Belo Horizonte e Juiz de Fora, só cerca de 70 contam com pista duplicada. Entre a capital mineira e o município de Congonhas, cerca de 20 quilômetros estão duplicados, enquanto, de Congonhas a Juiz de Fora, a rodovia apresenta pista predominantemente em multifaixas, com cerca de 50 quilômetros de pista duplicada em segmentos múltiplos isolados. Enquanto as intervenções estruturais não são realizadas, os usuários da rodovia correm riscos, já que a duplicação poderia evitar colisões frontais, tipo de acidente mais grave, segundo especialistas. A falta das obras acarretou em abertura de processo administrativo para apuração de responsabilidades da concessionária por parte da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Isto porque a Via 040 não transferiu a licença ambiental – necessária para obras de duplicação na rodovia – para sua titularidade.

A Tribuna esteve na rodovia entre Juiz de Fora e Santos Dumont, entre o Km 773 e Km 734, na última terça-feira (23), constatando um trajeto com dificuldades: falta de acostamento e de separação central em sua maior parte, curvas sinuosas e trechos com estreitamento de pista. Essas características, somadas à imprudência de motoristas, como excesso de velocidade, integram os principais fatores que contribuem para ocorrência de acidentes graves, de acordo com a Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Segundo a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), vinculada ao Ministério de Transportes e condutora do processo de licenciamento ambiental, a licença de instalação (LI) para a concessionária foi emitida em julho de 2016. Desde então, a via 040 “já estava apta” para realização das obras na rodovia, em uma extensão de 156,5 quilômetros, trecho correspondente ao Distrito Federal e Goiás. Por meio de uma retificação, realizada em abril de 2017, houve autorização para obras em mais 801,3 quilômetros, no trecho de Minas Gerais. Assim, de acordo com a EPL, restariam apenas 139,9 quilômetros do trecho mineiro, que estão bloqueados para execução de obras. Para essas intervenções restantes é necessária autorização do Instituto Estadual de Florestas (IEF/MG) e dos resultados do Estudo de Classificação do Grau de Relevância das Cavidades Naturais. A previsão é que os documentos sejam protocolados no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em novembro de 2019. Apesar da EPL ter se empenhado para obter a LI, a fim de “agilizar a liberação de frentes de obra quando da assunção da concessionária”, a empresa não é responsável pela execução das obras. Desta forma, conforme explicou a EPL, “a concessionária precisa requerer essa transferência, pois somente poderá executar as obras de posse da mesma.” Na prática, o trâmite consiste em uma solicitação ao Ibama por parte da Via 040. Em seguida, o instituto solicita à EPL a anuência e emite uma retificação da licença em nome da concessionária. Porém, como destacou a EPL, “desde a retificação da Licença de Instalação, a mesma está disponível para transferência de titularidade para a Concessionária Via 040”, o que ainda não aconteceu.

A ANTT reforçou que a licença foi emitida em nome da EPL em 2016, para o trecho de Goiás, e, em 2017, para o trecho de Minas Gerais, com determinados bloqueios. Entretanto, o fato de a Via 040 não ter transferido a licença ambiental para sua titularidade acarretou na abertura do processo administrativo para apuração de responsabilidades. O órgão federal esclareceu, ainda, “que não há impedimento à execução, por parte da VIA 040, da duplicação da rodovia, em sua grande parte, com exceção de alguns trechos ainda bloqueados.”

ANTT abre processo administrativo para apurar responsabilidades da concessionária que explora a rodovia no trecho. Dos 557,2 quilômetros que demandam as intervenções de duplicação, apenas 73 foram finalizados, ou seja, 13,1% do total previsto no contrato Foto: Olavo Prazeres

Em um primeiro questionamento da Tribuna à Via 040, a concessionária havia informado que os 73 quilômetros duplicados foram realizados nos locais onde havia licença ambiental que possibilitava as intervenções. Entretanto, a Via 040 informou que “a totalidade da duplicação prevista no contrato, está condicionada ao licenciamento ambiental completo, a cargo do Governo federal, de todo o trecho, o que não ocorreu integralmente até o momento, pois há trechos com bloqueios para obras, como no caso entre Belo Horizonte e Congonhas.” Procurada novamente para um posicionamento sobre a abertura do processo administrativo, bem como informações sobre o que estaria impedindo a continuidade das obras, a Via 040 explicou que “permanece aguardando a regulamentação da Lei 13.448/2017 pelo Governo Federal, processo que irá tratar da relicitação e das obrigações contratuais até que seja realizado um novo leilão”. A concessionária destacou, ainda, “que os serviços de operação, como inspeção 24 horas, socorro médico e mecânico, e a manutenção da rodovia, com trabalhos de conservação, sinalização, manutenção do pavimento continuarão a ser executados sem nenhum prejuízo aos usuários.”

Descumprimento de cronograma preocupa

Obras de duplicação em rodovias possuem grande influência na questão da segurança no trânsito, de acordo com o presidente da Associação Brasileira dos Usuários de Rodovias (Abur), Gerri Machado. Conforme Machado, quando há a necessidade de duplicação, significa que a via está sobrecarregada. Como o transporte no país é majoritariamente rodoviário, o contexto de operação no limite impacta no número de acidentes. “Se a rodovia está superlotada, começa a ter pontos de engarrafamento. O cidadão – já ansioso por natureza – fica naquele congestionamento, e começa a fazer ultrapassagem de risco, o que acaba ocasionando em colisão frontal. Normalmente, a colisão frontal resulta em traumas graves ou mortes.”
Além da garantia na fluidez do trânsito, outro ponto citado pelo presidente da Abur está relacionado a uma questão econômica. “Uma região com mais capacidade de mobilidade tem condições de receber mais investimentos de empresas. O desenvolvimento de um país depende de uma infraestrutura de qualidade porque a logística se torna mais barata”, explica.

Segundo Machado, obras de duplicação são alvos de preocupação da associação, já que o cenário no Brasil aponta o descumprimento de cronogramas previstos em contratos em diversas rodovias do país. Como não é possível rever as licitações em andamento, a cobrança está, especialmente, em novos processos. “É preciso que os novos contratos tenham garantia e que o Governo não permita que essas concessionárias atrasem o programa. Se não, cada hora é uma desculpa e quem paga o pato é o usuário que está pagando o pedágio, mas não tem obras realizadas”, afirma.

Entre JF e BH, só 70 quilômetros estão duplicados

Dentro das obras de ampliação de capacidade e melhorias, o contrato de concessão prevê também a conversão de trechos que hoje têm multifaixas para via duplicada, como em áreas entre Barbacena e Juiz de Fora. Neste segmento, por exemplo, há quatro faixas de tráfego (multifaixas), sem separação central. No relatório de fevereiro de 2015 das principais obras e serviços da Via 040, a concessionária incluiu uma lista de marcos contratuais, que indicava previsões para finalização das obras. A lista apontava que as intervenções nas multifaixas seriam finalizadas em abril de 2019. No total, 144,8 quilômetros deveriam ser convertidos. Entretanto, nenhum dos relatórios mensais apontou indícios de realização desses trabalhos. A Via 040 não informou sobre a situação das obras de conversão, nem se haveria intervenções previstas para o trecho da rodovia na região.

Dos cerca de 270 quilômetros entre Belo Horizonte e Juiz de Fora, aproximadamente 70 contam com pista duplicada, conforme o Programa de Exploração da Rodovia (PER), que especifica as condições para execução do contrato firmado entre a Via 040 e o Governo Federal, caracterizando todos os serviços e obras previstos ao longo do prazo da concessão. Entre a capital mineira e o município de Congonhas, cerca de 20 quilômetros estão duplicados, enquanto de Congonhas a Juiz de Fora, aproximadamente 50 quilômetros têm pista duplicada em segmentos múltiplos isolados, sendo que, no trecho, a rodovia apresenta pista predominantemente em multifaixas.

Acidentes

Conforme dados retirados do site da Polícia Rodoviária Federal (PRF), em 2018, foram contabilizados 188 acidentes no trecho entre Juiz de Fora e Barbacena, o que representa cerca de um acidente a cada dois dias. Desses, as ocorrências registraram 13 vítimas fatais e 39 com ferimentos graves. Em trechos com via simples, foram nove óbitos e 22 feridos gravemente, enquanto, em pista dupla, quatro óbitos e 17 lesionados.

Como lembrou o policial rodoviário Bruno Pires, no último domingo (21), um jovem de 19 anos morreu em um acidente na BR-040, próximo a Santos Dumont, após uma colisão frontal entre um carro e uma moto, na qual estava a vítima. “Além das curvas muito sinuosas, a questão de ser pista simples – já que não foi duplicada ainda, embora prevista no contrato da concessionária – também contribuem com acidentes graves. Esse, por exemplo, que aconteceu no domingo, com vítima fatal, ocorreu porque o condutor perdeu o controle em uma curva e invadiu a contramão. Se fosse uma pista dupla, provavelmente não teria acontecido”, explica Pires.

Isso porque, conforme o PRF, as pistas duplicadas com separações centrais podem evitar colisões frontais, tipos de acidentes mais graves. “As colisões frontais causam muito impacto, porque é o tipo de colisão com mais vítimas fatais”, explica. “Os vetores fazem com que o impacto seja muito mais forte.”

Trabalhos tiveram início em 2014

De acordo com os relatórios mensais das principais obras e serviços da Via 040, a duplicação da BR-040 se iniciou em julho de 2014, em uma extensão de cerca de 58 quilômetros, de Cristalina (GO) a João Pinheiro (MG). Tais intervenções foram finalizadas em junho de 2015, integrando os 10% iniciais das obras de duplicação e a primeira etapa da concessão da rodovia.

A duplicação foi retomada em novembro de 2015, prevendo mais 13 quilômetros também em João Pinheiro, e em Luziânia (GO). As intervenções só foram concluídas quase três anos depois, em julho de 2018, somando um total de 73 quilômetros duplicados, o que representa 13,1% dos 557,2 quilômetros totais previstos no contrato de concessão, assinado em março de 2014. Desde a conclusão da duplicação dos 73 quilômetros, não houve mais intervenções de ampliação.

No relatório de fevereiro de 2015, a lista de marcos contratuais indicava que os trabalhos de duplicação dos primeiros 109 quilômetros seriam finalizados em abril de 2016. Ainda pelas previsões, todo o serviço, nos 557,2 quilômetros, seria concluído em abril de 2019. Entretanto, a partir de abril de 2016, os relatórios destacaram que as obras dependiam da obtenção e repasse da titularidade da Licença de Instalação, e as previsões foram retiradas da lista de marcos contratuais.

Prazo de quatro anos

Segundo o Programa de Exploração da Rodovia (PER), as obras de ampliação de capacidade e melhorias, o que inclui a duplicação, iniciam-se a partir da data de expedição da Licença de Instalação. O documento destaca que o período para realização das intervenções é de até quatro anos, salvo determinadas exceções indicadas. No caso, durante o primeiro ano, as obras seriam de 109 quilômetros. Outros três anos iriam se dividir com intervenções em 149,4 quilômetros cada, totalizando os 557,2 quilômetros que necessitam de duplicação.

Via 040 quer devolver concessão

Sancionada em junho de 2017, a lei federal 13.448 permite um processo de relicitação, ou seja, “procedimento que compreende a extinção amigável do contrato de parceria e a celebração de novo ajuste negocial para o empreendimento, em novas condições contratuais e com novos contratados, mediante licitação promovida para esse fim”. Seguindo a legislação, em setembro do mesmo ano, a Invepar tornou público que pretendia devolver a concessão da via à União.

A concessionária ainda mantém o posicionamento, tendo manifestado, inclusive, em seu relatório anual de 2018, disponibilizado na central de sistemas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No documento, a Invepar informou que, “no ambiente regulatório, aguardamos desfechos favoráveis em questões relevantes junto ao poder concedente, incluindo os pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão e a devolução da Via 040”.
Em agosto do ano passado, o ex-presidente Michel Temer sinalizou que iria assinar o decreto de regulamentação da lei de relicitação, entretanto, a proposta ficou no papel. Desta forma, conforme informou a Via 040, em nota, a concessionária permanece aguardando a regulamentação da lei.

A ANTT comunicou que a concessionária solicitou a devolução amigável da concessão, conforme previsto na lei, e reforçou que a mesma “aguarda a edição de Decreto, pelo Poder Executivo, que regulamentará os termos dessa devolução”. Ainda segundo a ANTT, se a devolução for concretizada, “os investimentos serão suspensos, cabendo à concessionária executar serviços de operação, manutenção e conservação.”

Discordância de opiniões

A demora para regulamentação da lei 13.448 pode estar relacionada a uma discordância de opiniões entre os ministérios da Economia e da Infraestrutura, conforme apontou reportagem publicada na terça-feira (23) pelo jornal “Valor Econômico”. O imbróglio estaria travando a publicação do decreto por conta do direito de indenização às empresas por investimentos ainda não aplicados. Enquanto o Ministério da Infraestrutura sustenta uma metodologia de cálculo para essas indenizações, o Ministério da Economia se demonstra contrário à ideia.

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Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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