‘Temos que confessar que não temos domínio da situação’, diz infectologista do HU

Rodrigo Daniel concedeu entrevista à Rádio CBN na manhã desta terça (Foto: Eduardo Valente)

O potencial de disseminação do novo coronavírus (Covid-19) em Juiz de Fora é incerto e não há como projetar como irá se comportar o sistema de saúde brasileiro. São conclusões do médico infectologista Rodrigo Daniel, responsável pelo setor de vigilância em saúde do Hospital Universitário (HU) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Em entrevista à Rádio CBN nesta terça-feira (31), o especialista fez uma análise do combate à pandemia no município até o momento, mas apontou indefinições sobre o futuro epidêmico na cidade.

O isolamento domiciliar adotado em Juiz de Fora e em várias cidades do país é tido por Rodrigo Daniel como um importante aliado neste momento. Segundo o infectologista, o número de casos na cidade – 27 confirmados pela Secretaria de Saúde (SS) municipal até segunda-feira (30) – está abaixo do inicialmente esperado, reflexo da política de esvaziamento das ruas, e auxilia na absorção dos casos pelo sistema de saúde do município.

“O isolamento, talvez, não diminua tanto o número de casos. As pessoas inevitavelmente vão ter o coronavírus. A principal utilidade é a gente conseguir ganhar tempo para se reestruturar. Se a gente não tivesse essa parada, o sistema de saúde estaria saturado”, afirma o médico, ainda incerto sobre quando se dará o momento de maior quantidade de contaminações na cidade. “Tudo vai depender de como vai se comportar o afastamento. Se isso for mantido, dificilmente vamos ter, em um curto espaço de tempo, um aumento grande”, salienta o profissional.

O iminente relaxamento das medidas de isolamento social deve significar aumento expressivo no número de enfermos e há dúvidas sobre como as unidades médicas vão se comportar. Também há indefinições sobre como se dará a transição do isolamento total para o parcial, de acordo com o especialista, e não é possível projetar cenários muito à frente. “Tem muita gente falando como se tivesse autoridade no assunto, falando que tem que ser mantido (o isolamento social). Mas ninguém fala quando vai ser o marco de parar”, alerta Rodrigo. “As pessoas estão falando com uma autoridade que não têm. Nós temos que confessar que não temos domínio da situação, não sabemos como (o coronavírus) vai se comportar”, conclui.

Jornalistas Cris Hübner e Ricardo Ribeiro entrevistaram Rodrigo Daniel (Foto: Eduardo Valente)

Aumento exponencial em casos suspeitos

Com dificuldade na testagem dos pacientes, os casos suspeitos de infecção pelo novo coronavírus chamam a atenção, com aumento exponencial, segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES/MG). Conforme o boletim epidemiológico da pasta estadual, o quantitativo de pacientes em investigação saltou de 11.832 para 34.224 entre o último dia 24 e esta terça-feira, crescimento de quase 200% em uma semana. O infectologista Rodrigo Daniel acredita que os dados devem ser relativizados, uma vez que há coincidência no período de aumento da gripe comum, mas as transmissões comunitárias preocupam. “Temos que pensar a sazonalidade e ver, comparativamente, as internações por pneumonia do ano passado e deste ano. A comparação é que vai chamar atenção, porque as pneumonias vão continuar acontecendo”, explica.

Testes rápidos

Para diminuir o contingente de demanda reprimida da testagem em âmbito nacional, a aquisição de testes rápidos em larga escala pelo Ministério da Saúde foi vista, inicialmente, como uma medida fundamental. Entretanto, conforme Rodrigo, o modelo de testagem é efetivo apenas em pacientes que foram infectados há seis ou sete dias e os anticorpos começaram a agir, o que limita a utilização do material. “Se a gente ficar aguardando a chegada dos testes, vamos ter um atraso muito grande na gestão dos casos. Para a pessoa que acabou de adoecer, ele não vai adiantar”, analisa. Segundo o especialista, os testes rápidos deverão ser empregados sobretudo no diagnóstico de profissionais da saúde que atuam na linha de frente do combate à epidemia.

“Mortes são inevitáveis”

O médico também destacou a impossibilidade de evitar todas as mortes em decorrência do novo coronavírus. A função do sistema brasileiro de saúde, para o infectologista, é diminuir ao máximo a quantidade de vítimas fatais da Covid-19. “As mortes são inevitáveis. A gente sabe que o coronavírus, quando acomete as pessoas principalmente acima de 80 anos, uma em cada sete acaba morrendo. Aquelas pessoas que já tinham um risco grande de morrer nos próximos meses podem ter o óbito adiantado por essa infecção”, afirma Rodrigo.

Postado originalmente por: Tribuna de Minas – Juiz de Fora

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